NA PADARIA RUBI
—Qual a razão do
ódio às sapas nos últimos 2000 anos?
—Gore Vidal
responde, minha querida.
—Obrigado, Rospo,
mas sei que tem algo a ver com...
—Isso mesmo!
—Já aconteceu no
passado, no período medieval, por exemplo, de se disfarçar a defesa
de um totalitarismo com...?
—Com...?
—Bem, todo poder
centralizado resvala no totalitarismo... ou serve de cobertor...
—Sapabela, hoje é
domingo, dia de se refletir leve.
—As coisas
imensas não sossegam...
—Verdade, mas às
vezes você quer pensar pelo mundo...
—Rospo, acredite,
não estou sozinha...
—Eu sei, milhões
de sapas no mundo também já estão refletindo sobre as razões da
opressão e do ódio às sapas nos dois últimos milênios.
—Rospo, você
anda esquecido...
—Você que pensa!
Quero convidá-la agora para...
—Aceito!
—Vamos até a
padaria Rubi.
*
—Rospo, nada como
o licor de domingo... Logo ao amanhecer, abrindo o dia...
—Verdade,
Sapabela. Estarei aqui sempre, com você...
—Às vezes, ser
alienada é uma opção. Você pode ficar parada, com seu barco, na
beira do cais, esperando a noite chegar... E depois, adormecer... E
então se dar conta da sua dormência durante o dia...
—O entorpecimento
seria a vida sem autenticidade, não é?
—Escritores,
poetas, filósofos, artistas, sempre alertaram, emitiram seus gritos
como feixes de luzes sonoras de besouros celestiais, sempre
alertaram, clamaram, pela vida autêntica...
—Por que me disse
que ser alienada é uma questão de opção?
—Às vezes,
Rospo. Na maioria dos casos é opressão mesmo... Mas tem casos em
que a sapa se nega a ver, e a lutar... Prefere viver uma
circunstância de acomodamento... Se todas entendessem que o
sacolejar da alma é tudo. As aventuras só querem existir... Não
podemos bloquear a energia universal que nos perfura, nos atravessa,
a cada nova manhã...
—Uma coisa é o
medo... do desconhecido...
—Uma vez, faz
tempo, uma sapinha perguntou: “Por que devo temer em vez de somente
amar?”
—Incrível! Você
voltou ao ponto de partida!
—Rospo, certa vez
estava lendo um livro e o considerei meio difícil, porém
saboroso...
—E então?
—Então,
compreendi pela primeira vez que eu era a grande parceira do autor...
E compartilhei o livro com a minha alma... Fui em direção ao livro.
Estive nele... Descobri que ele estava lá, em minhas mãos,
esperando por mim...
—Sapabela, você
é a alegria da minha vida.
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