quinta-feira, 14 de abril de 2011

QUINTAS — 52

E O RIO FOI AO CINEMA?


Um dia após o massacre numa escola, que resultou na morte de doze crianças, estreou nas telas o filme Rio, que tem como protagonista Blu, uma ararinha azul em extinção, a última da espécie, e sua bela namorada. Em poucos dias de estreia já se tornou a maior bilheteria do ano e está entre as cinco maiores bilheterias de cinema no Brasil,

ou seja, está entre  "Homem Aranha 3", "A Era do Gelo 3", "Lua Nova" e "Tropa de Elite 2".
  Foi amplamente anunciado e divulgado em todas as mídias, como de fato deveria acontecer com todas as obras voltadas para a criança, seja no cinema, no teatro, na música, nos quadrinhos, na literatura...
E assim aconteceu com RIO, que, tal como ocorre com os filmes americanos, teve o seu lançamento antecipado, ou seja: antes de chegarem ao cinema, os protagonistas vão ao fast food e surgem em anúncios de produtos de alimentos, em cartões de créditos, e são vistos na propaganda de empresas gigantescas, algumas distantes do universo infantil.
Aparecem em álbuns de cards, em CDs com jogos, em peças publicitárias, em adesivos, de uma tal forma que quando a criança é levada ao cinema geralmente já sabe tudo sobre os personagens e já conhece quase tudo sobre a história.
Até um blog anunciou o filme!
O anúncio e a divulgação de um filme infantil por um blog de literatura tem motivações e interesses bem diferentes daqueles que movem uma empresa a fazer o mesmo. E não há incompatibilidade nem contradição no fato de que um blog esteja anunciando gratuitamente um filme ao mesmo tempo em que uma multinacional o faz por intermédio de milionários contratos.
Para exemplificar um pouco a questão da não contradição e também das motivações e dos interesses, veremos, de forma sucinta, esse caso específico. Para o blog não interessa a venda da imagem do Rio para o exterior, visando seja a Copa do Mundo de 2014 ou as Olimpíadas de 2016. Também não tem, de forma alguma, o interesse na ampliação do turismo. Nada disso interessa ao blog. O que de fato o move nessa empreitada é justamente a intenção de levar a criança ao cinema, todas as crianças.
É uma motivação puramente amorosa, pedagógica. Se entrar uma só ideia de lucro, uma centelha que seja, para o blog perde o sentido.
Um blog é um ato de amor, é mais que isso, bem já disse alguém, é como se fosse a casa de uma pessoa. É a extensão de sua alma, acrescento. Um blog não transita no universo dos lucros, não almeja benefícios fiscais nem isenção ou abatimentos no Imposto de Renda. Nada disso interessa ao blog. Ele quer que a criança vá ao cinema, pois lá é um de seus lugares. Além da escola, criança tem outros espaços para desenvolver de forma plena e saudável a sua infância, entre os quais o parque de diversões, o teatro, e o cinema.
O filme RIO é bonito, é bem feito, com imagens de um esplendor, da forma como toda criança merece, e o Rio de Janeiro, é lindo, é "bonito por natureza", tal como é um "país tropical". É "o mais lindo espetáculo da Terra". Quem duvidar disso, é só pôr os olhos.
O filme é veloz, atendendo assim ao ritmo e ao espírito da época. Nem o adulto tem tempo para a reflexão, nem criança quer pensar. Ela quer ritmo, velocidade, essa linguagem de videogame, Para o bem ou para o mal, é assim que a coisa funciona hoje. Até aí o filme dirigido por Carlos Saldanha em nada difere das outras produções norte americanas. Mas isso não invalida a obra. A questão é outra.
Se ninguém em sã consciência pode negar a estética natural do Rio, a sua beleza inconteste, que é uma maravilha de encher os olhos, os estereótipos presentes no filme são os mesmos que permeiam o inconsciente coletivo de um povo. Dessa forma todos acabarão acreditando que o Rio é apenas isso: samba e carnaval. que a sua constituição social e cultural seria assim. Pois fica mesmo essa impressão. Essa "essência" do Rio estaria na alma de todos os seus moradores?
Cantar o Rio e mostrar a sua beleza natural e a sua condição de cidade maravilhosa sempre esteve na vontade e na necessidade de artistas e personagens através do tempo. Zé Carioca, o simpático papagaio da Disney, Carmem Miranda, etc ... Só aves. Ela também voava. Ok? Também pudera. É tudo tão lindo!
Tem mesmo que mostrar. O Rio é tão belo, afinal. Mas não é só Fevereiro, não é só samba.
De qualquer forma, poderão argumentar: chega de filmes que mostram a pobreza, o submundo! Chega de filme que só mostra a realidade! Se o povo gostasse tanto de realidade nem assistiria as novelas. E aqui antecipo outro argumento: Uma obra de arte, o cinema, tem mesmo que mostrar a beleza e a fantasia, a ilusão e a alegria...
Mas insisto, só pra azucrinar. O Rio não é só carnaval e samba.
Rio, meu encanto! Rio de Cartola, de Noel Rosa. Quem é você?
Também se poderia argumentar que para a criança não interessa a feiúra nem a violência... Nada disso interessa na formação da cidadania do futuro. A criança precisa acostumar o seu olhar com o belo e o seu espírito com a alegria. Só assim construiremos uma geração de amantes da arte e do belo. De qualquer forma, diriam: os contrabandistas de animais silvestres estão no filme. E isso basta. Enfim, sob vários ângulos o filme pode ser debatido.
Tirando essas poucas questões, vá sim, ao cinema, ver RIO...
E, criança, lembre-se de Blu, esse simpático e adorável personagem... Ele tem um recado, ao modo do cinema: É preciso preservar a natureza e proteger as espécies em extinção.

MARCIANO VASQUES

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