segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Vice-Versa de setembro de 2011



Queridos amigos!

Apreciem, no mês de setembro, as entrevistas da escritora Rosa Amanda Strausz (RJ) e do escritor Leo Cunha (MG)

Um abraço,

Regina Sormani




Respostas de Rosa Amanda


1- Seu "Deus me livre!" é uma pérola do humor politicamente abusado. Você acha que o mercado hoje (incluindo todo mundo: autores, editoras, escolas, crítica etc) está menos ou mais careta do que quando você escreveu esse livro, na década de 1990?

R: O mercado infantil do livro sempre foi muito careta. Existe um grude pedagógico no livro do qual ninguém se livra. De um modo geral, as crianças veem barbaridades na TV, na internet e nos videogames, mas se um livro traz a palavra "merda" cai o mundo. Sexualidade na novela, pode. No livro, não pode.


2- Você foi uma das pioneiras no Brasil a usar a internet para divulgar e debater a literatura infantil e juvenil, ainda na década de 90, com o site Doce de Letra. Você acha que a LIJ tem explorado bem os recursos da internet e do ciberespaço, tanto em termos de divulgação quanto como ferramenta criativa? O que você destacaria?

R: Não tem,  não. As exceções são raras. Entre elas, destaco o trabalho que o Guto Lins vem fazendo com o Eros & Psique.com.br. Mas as dificuldades são muitas, principalmente porque as editoras não investem em nada que não estejam acostumadas a fazer. 


3 - Vários de seus livros parecem inspirados em passagens de sua vida familiar e afetiva. Quando os filhos acabarem de crescer, você acha que isso vai mudar alguma coisa na sua produção?

R: Tudo o que eu vivo pode ser transformado em matéria ficcional e as vivências familiares não são exceção. Mas, meus livros também são inspirados em outros livros - como no caso da Alecrim, que tem os livros da Sylvia Orthof como referência; em Os meninos-caracol uso a história do Gato de Botas para falar de reforma agrária. Outros saem de relatos, como Uólace e João Victor, que nasceu de conversas que tive com um menino de rua e com o pessoal do projeto Recuperarte. Enfim, a vida está aí, não falta material. É mais fácil eu parar de escrever para crianças pelos entraves do mercado do que por falta de inspiração.

4 - Tenho a sensação de que o mercado editorial, atualmente, tem priorizado bastante os livros em série e as coleções bem amarradas. Quais as vantagens e desvantagens dessa opção editorial, na sua opinião?

R: A vantagem mais imediata é a orientação do leitor. Quando ele gosta de um autor ou de um gênero, pode se guiar pela coleção, que funciona como uma espécie de curadoria. A desvantagem é dar ao leitor a ideia de que ele vai encontrar sempre mais do mesmo, o que nem sempre é verdade. Pessoalmente, acho muito chato escrever para coleções, o que não me impede de fazê-lo.



Respostas de Leo Cunha

1) A musicalidade da palavra é um referencial forte na sua obra. É fácil perceber isso na poesia e você chegou a transformar poemas em canções no Clave de Lua. Mas, até mesmo na crônica essa característica está presente. Não dá para esquecer do "bendi teu fruto" do livro Tela Plana - crônica de um país telemaníaco. Como é a sua relação com a música? O que você gosta de ouvir? Você usa a música como inspiração enquanto está escrevendo?


R: Sou fascinado pela música e pelos músicos. Aliás, tenho muita inveja dos músicos, o dom deles me parece algo mágico, inexplicável. Por sorte (ou por escutar muita música desde pequeno), meus textos têm mesmo um forte elemento sonoro. Eu tenho diversos "parceiros" espalhados pelo Brasil, músicos e professores de música que, mesmo sem me conhecer pessoalmente, resolvem musicar poemas meus e me mandam email contando isso e enviando a canção em MP3. Tenho cerca de 60 poemas musicados, e na maioria das vezes nunca encontrei o compositor!
Meu gosto musical é muito eclético: ouço muito rock, muita MPB e adoro os clássicos do cancioneiro norte-americano, como Gershwin, Cole Porter, Irving Berlin, Rodgers e Hart. Entre os letristas, meus ídolos são Chico Buarque, Aldir Blanc, Cazuza e Arnaldo Antunes. Quando estou escrevendo, porém, não posso escutar músicas que tenham letra, pois isso me distrai demais. Prefiro escrever no silêncio ou ouvindo música instrumental, seja erudita ou jazz.


2) Poesia, conto ou crônica? Quando você se senta diante da tela branca do computador, o que o faz decidir?


R: Muitas vezes uma mesma ideia já circulou entre as três formas. Uma frase ou um diálogo nasceu num poema e migrou para uma crônica. Ou um poema curto se alongou e virou uma narrativa  em prosa poética. Foi o que ocorreu com meu livro "O sabiá e a girafa" (publicado originalmente pela Nova Fronteira, e que em breve será relançado pela FTD), que nasceu como um poeminha, mas cresceu e virou uma narrativa mais longa.
Mas muitas vezes eu tento me disciplinar para criar num gênero específico. Por exemplo: se estou escrevendo um livro de poesia com um determinado tema, eu tento focar meus rabiscos nessa direção. O mesmo ocorre se estou organizando um livro de crônicas.


3) Sua tese de mestrado discutia o hipertexto, você acompanha de perto as novas linguagens, brinca com as possibilidades da máquina em poemas animados. Como a tecnologia influencia o seu trabalho?


R: Sou principalmente um curioso, em termos de tecnologia. Gosto de pensar nas potencialidades que determinados softwares ou ambientes trazem para a criação literária. Acredito que a literatura infanto-juvenil ainda está engatinhando em termos de explorar narrativas ou poesia hipermidiática. A maioria do que vemos está puxando muito para o game do que para o que pode haver de literário nestes recursos.
Não tenho um talento natural para lidar com a tecnologia, pelo contrário, o que eu consegui criar usando estes recursos (por exemplo, no livro Vendo Poesia) foi fruto de muita observação, muita insistência, teimosia, erros e frustrações.


4) Outro dia, conversando com um DJ de 21 anos a respeito de mash ups, ele me saiu com essa: "a gente só ampliou essa história de intertextualidade da geração de vocês para as outras mídias". O que você acha disso?


R: Concordo em parte. Realmente a produção literária das gerações pré-internet já era fortemente intertextual, recheada de alusões, citações, homenagens, pastiches, colagens. Na literatura infantil, por exemplo, a presença dos recontos e das paródias é marcante.
Os mash ups seguem a mesma linha, acredito, e conseguem criar muita coisa legal, recorrendo à lógica da colagem e/ou da convergência de mídias e plataformas. Na área da criação artística, porém, muitas vezes os mash upscruzam a linha (que é tênue, obviamente) entre a intertextualidade e o plágio. 

Abraços,
Leo Cunha

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